domingo, 10 de maio de 2009

Os filmes comerciais e a pobreza da fórmula

O cinema é uma das artes mais populares do mundo atualmente, e ao mesmo tempo vítima de uma massificação que o torna extremamente pobre. Poucos realmente conhecem essa arte em seus diversos potenciais e matizes, apesar do seu grande uso em todo o mundo.

Filho da sociedade industrial, o cinema é algo recente e ainda em grande experimentação, mas que já tem sua força e diversidade acorrentadas pela tradição de uma estética extremamente repetitiva, galgada em fórmulas pobres e limitadas. O cinema comercial não está preocupado com inovações, com experimentações estéticas ou encorpamento de conteúdo: para ele um filme é apenas mais uma mercadoria como qualquer outra e deve possuir uma forma acessível e vendável. Na perspectiva de que o cinema pode ser bem mais que, por exemplo, aquela velhas narrativas com início, clímax e final de temas batidos e reincidentes de Hollywood - mas não apenas de Hollywood visto que a estética hollywoodiana é repetida em todo o globo - essa limitação estética ata a produção de outros tipos de cinema e, conseqüentemente, a exploração dos potenciais da linguagem cinematográfica.

Essa convenção estética não é apenas ruim no que diz respeito a limitar os aspectos artísticos do cinema. Ela também é uma forma de domínio ideológico. Ao contrário do que a mídia tenta provar o tempo todo, o cinema não é apenas um meio de entretenimento, ele é um instrumento de reprodução de discursos, de idéias, de opiniões, de valores - de uma ideologia. O cinema - seja isso evidente ou não - carrega consigo uma carga política. Ele também constrói a noção do que é aceitável ou não, seja no condicionamento de uma uma narrativa fílmica - ao exemplo das pessoas que veem tanto os filmes organizados com princípio meio e fim, que estranham um filme sem final ou narrado sem linearidade -, ou na reprodução de valores - mostrar o que é certo ou errado, mostrar certos agentes sociais - polícia, comunistas, padres, ladrões, mendigos, prostitutas - com um estereótipo determinado.

Essa massficação leva a um condicionamento estético que acostuma a população com um padrão extremamente simples e didático, restringindo as possibilidades do cinema se desenvolver, mas acima de tudo, de levar as pessoas a questionarem seu contexto social ou o próprio conteúdo fílmico.

Por conseguinte, a pobreza do cinema comercial não é apenas estética, mas também de conteúdo. Refluxo de uma sociedade (de controle) preocupada em manter uma organização, um sistema, que procura inibir, através de padrões, a gama de interpretações, pensamentos, comportamentos ou outras manifestações do homem, pois elas se mostram muito perigosas à manutenção desse sistema.

Essa pobreza que é oferecida ao público em geral - constatada nos filmes oferecidos nos cinemas -, priva a população de outros olhares sobre o filme em sua forma e conteúdo. Na verdade, o que é negado ao público são outras possibilidades de leitura e questionamento!

Fica-se acostumado com fórmulas, soluções práticas, receitas e situações previsíveis, quando a realidade se mostra sempre imprevisível e plural. Contrói-se um mundo de fantasia, uma leitura ilusória do mundo que além de frustrante - pois ela nunca dá conta do real pelos motivos explicitados - permite às forças daqueles que dominam o sistema, manterem sua privilegiada situação.

Concluindo, quero dizer que, na verdade, o cinema comercial é um fenômeno sintomático das relações de poder que sustentam nossa sociedade e que permitem a uma elite não apenas dominar o mercado fílmico mundial, mas alienar uma população que perde este forte veículo de questionamento que pode vir a ser o cinema.

4 comentários:

Unknown disse...

Muito bom esse texto. Mas é bom salientar que isto não ocorre somente com o cinema, mas tbm com todas as outras expressões artísticas, embora no caso das artes plásticas e esculturas isto não seja tão claro (por falta de conhecimento) para mim.... Mas com certeza é evidente no caso da música. E na música isso ainda é mais forte pela facilidade de produção e reprodução... Fica mais evidente, além de outras coisas, pelo o conteúdo das letras, mas a forma também é um meio de manipulação de massa e de alienação, porém poucas pessoas se ligam nisso, inclusive as "engajadas", as de esquerda que pensam que escutam algo diferente por causa da letra, mas esquecem da forma como o conteúdo é apresentado. Na maioria das vezes não há uma relação coerente entre forma e conteúdo na música... Música vai mais além do que é dito no meio dela, música é essencialmente som. E na forma como o som é trabalhado também existe ideologia... Há sons mais dançantes que outros, mais hipnotizantes que outros, mais melódicos e etc, (são exemplos simples, mas só pra lembrar que havia grande conteúdo político e ideológico nas músicas de Richard Wagner e L. van Beethoven - só para citar alguns dos mais famosos, mas a lista é grande) isso tudo é pensado na hora da construção de uma música que tem a finalidade de vender, vender, vender...... enfim, pra não ficar um comentário muito grande eu paro por aqui. depois conversamos mais sobre isso.

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

quem escreveu aí em cima fui eu, juninho! =p

Áquila disse...

Realmente interessante. Mas, como já foi mesmo falado ai acima, isto não é um "privilégio" do cinema, mas com certeza, está mais evidenciado no cinema mesmo. Até por que o cinema é uma arte mais... "cômoda" e popular, digamos assim. Porém, mesmo com toda essa banalização da arte fílmica, ainda há um conteúdo relevante a ser estudado, inclusive nos filmes comerciais. Não que isto seja mérito do filme em si, mas dos valores a ele atribuídos, por que, querendo ou não, a visão dos autores/diretores/produtores estará implícita. No mais, é um ótimo texto. "depois conversamos mais sobre isso." [2]