quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Democracia e Crise

Lendo sobre Brasil Império me surgiu uma dúvida: uma democracia deve ser estável? Se Bonifácio que defendia uma monarquia constitucional nos meados do século XIX, acreditava que sem a monarquia não haveria liberdade e estabilidade, será que ele estava completamente errado?
De certa forma, pensarmos em uma democracia não implicaria certa instabilidade, fruto das disputas entre setores sociais e o embate constante que deveria caracterizar uma democracia real que sustentasse um espaço político de efetiva participação daqueles que compõe tal sociedade? Assim, não seria a crise, ou tendências a crise, uma característica (em devidas proporções) das sociedades democráticas?
Não se trata aqui de fazer uma defesa de regimes autoritários e não democráticos, mas, pelo contrário, de perceber que esse embate e crise são necessários e devem ser estimulados para que os processos de mudança político-social continuem a se constituir indefinidamente.
Não seria essa a lógica de uma democracia, não estaríamos em muito ainda presos a uma idéia de estabilidade que talvez seja incompatível com a idéia de democracia?

Talvez, uma pista para compreender isso seja o estudo da economia política, uma vez que quando pensamos em crise e na maioria de momentos históricos desde a constituição da sociedade moderna, a instabilidade política reflete em instabilidade econômica e, conseqüentemente, perdas econômicas especialmente para as elites que dominam, característica inerente às sociedades capitalistas.
Dessa forma a instabilidade política significa prejuízo, perda de lucro. Obviamente não podemos resumir os momentos de crise a apenas um prejuízo às elites, visto que setores médios e populares também perdem e sofrem com o evento, porém, usualmente, quando ouvimos na mídia e outros interessados na manutenção do interesses de tais setores - produzindo vasta literatura jornalística ou acadêmica sobre o assunto - relacionam em geral a crise a tais perdas de possibilidades de lucro ao que de fato estão interessados.
Em síntese, quero chamar a atenção que para sociedades em que a estabilidade econômica está no cerne das preocupações para a manutenção do lucro, tenta-se transpor tal idéia como algo universal - inválido de fato, visto que esses momentos podem gerar mudanças para outras formas organizacionais (chegando ao outros modos de produção) o que tentam combater - e que se relaciona muito mais com uma preocupação econômico-privada, chocando-se inevitavelmente com a lógica de uma sociedade democrática.

Obviamente esse combate à crise econômica está ligado muito mais ao espaço econômico-político de atuação de tal elite, uma vez que para um grupo uma crise econômica pode ser interessante quando representa oportunidade de alcance de um maior mercado - quebra concorrentes, países onde matérias e mão-de-obra se tornam mais baratos. A sociedade capitalista também se utiliza, assim, das crises para alcançar o êxtase de seu laissez-faire, todavia, não suporta que essas crises levem ao questionamento de sua própria estrutura, enquanto sistema econômico capaz de traduzir-se meio de ampla satisfação das necessidades humanas.

A democracia se mostrou interessante para esses setores quando representou oportunidade de chegarem ao poder em espaços antes limitados a outros grupos, sejam de outros interesses capitalistas, ou no caso do Brasil Império, da corte portuguesa. Assim como no Brasil momentos de lutas democráticas representou, na verdade, uma ascensão de uma elite interessada em outro tipo de política econômica mais voltada para a indústria (Revolução de 1930), mas que pode ser invertida quando em outros momentos utiliza-se da própria via anti-democrática (ditadura militar de 1964) para manutenção de seus interesses, e que a descarta quando não lhes mais interessa - Redemocratização de 1980.

Evidentemente não podemos restringir esses momentos de passagem histórica a tais estruturas, eles representam uma dinâmica mais ampla que diversos outros atores sociais interagem, porém podemos procurar diagnosticar a performance de certa elite durante tais processos e sua relação com o idéia de Democracia.

Democracia significaria certa crise e não seria ela do nosso interesse? Uma sociedade alternativa a sociedade capitalista que se paute a conservar liberdades individuais e políticas através da democracia deve compreender que esse espaço de questionamento e crise precisa ser preservado.

Liberdade real, não a liberdade proporcionalmente imaginária em prática e discurso de uma sociedade capitalista na qual a liberdade de consumo se apresenta enquanto liberdade e emancipação pessoal, na mesma medida em que excluí a maior parte da população daquilo que produz.

http://processosubjetivo.blogspot.com

PS: Céus, tanto estudo tem que servir para alguma coisa, tanto ler na universidade e não conseguir produzir algo concreto que seja nosso, a fim de expressar essas ânsias é angustiante. Trabalhar, militar, estudar, mas ser humano também! Arte e expressão tão em necessidade aqui... ¬¬
Não suporto essa coisa do "seja o homem que corre e faz de tudo", o homem moderno que tem que ser tudo e termina sendo nada e ainda por cima infeliz. Chega de cultivar a insatisfação como se isso proporcionasse caminhos de elevação individual, precisamos ser felizes!

Um comentário:

Jivago Meira disse...

A crise força o aprendizado

"Chega de cultivar a insatisfação como se isso proporcionasse caminhos de elevação individual, precisamos ser felizes!"