domingo, 20 de dezembro de 2009

A Face do Verso

Procurando um texto para uma discussão de opressões para o CAHIS me deparei com este texto que me chamou a atenção:

"Toda a minha vida quis que as pessoas ouvissem o que tenho a dizer sobre o que acho que tem valor e importância para mim.Foi impossível.Todos os que encontrei só sabiam ver em mim um homossexual. O que eu sentia, sentia desta ou daquela maneira, porque era homossexual. Me falaram o tempo inteiro do meu jeito homossexual; da minha sensibilidade homossexual; de minha história homossexual; do meu sexo homossexual; de minha tendência homossexual. Dos amigos aos analistas todos, todos, só sabiam dizer: “esconda! Mostre!”; “seja homossexual, não seja homossexual”. Muitas vezes pensei, quando encontrava pessoas que ainda não conhecia, em pedir-lhes, como em O fantasma da Ópera, “close your eyes”, olhem através de mim, vejam o que existe e que não é homossexual. Impossível. Acabei cedendo; achei sendo “um homossexual”; “acabei sendo um gay”. Agora, que estou perto de morrer, talvez me deixem em paz. Achei que podia encontrar alguém que me ouvisse falar do que gostei, de quem amei, do que me fez triste, alegre, etc. Por isto te procurei. Vou morrer, já posso deixar de ser homossexual"


(Citação do livro A Face e o Verso de Jurandir Freire Costa. Essa é uma resposta de um rapaz de 32 anos ao ser questionado pelo motivo que o levava ao consultório do autor)

Ainda hoje a homossexualidade permanece como tabu para a sociedade brasileira e mundial. Apesar do caráter aparentemente democrático de nossa sociedade, homossexuais (assim como outros grupos minoritários) encontram dificuldades para viver plenamente suas potencialidades, realizar seus objetivos, sonhos, desejos.

Em Berlim, entre a Primeira Guerra Mundial e a ascensão nazista, os homossexuais encontraram um período de liberdade, podendo ir às ruas, abraçar e beijar seus companheiros e companheiras com maior conforto e dignidade. No entanto, com o desenrolar do regime nazista, foram perseguidos, capturados, presos, torturados, mandados a campos de concentração e assassinados.

Algumas gerações passaram e mesmo com tais regimes totalitários mais distantes – no Brasil temos uma redemocratização recente – os homossexuais permanecem marginalizados, obrigados a viver em guetos, encontrando diversos obstáculos legais, sociais, econômicos, bem como todos os demais problemas inerentes à conjuntura atual de nossa sociedade, tendo como agravante sua condição homossexual extremamente recharçada socialmente.

O Movimento Homossexual (como diversos outros) tão mais fortes e vigorosos algumas décadas atrás em momentos de grande efervescência político-juvenil, não se encontra com a mesma força, tendo seu principal veículo de manifestação política – a Parada Gay -, cada vez mais um caráter carnavalesco, sem garantir um espaço reivindicatório realmente eficiente na luta por uma maior possibilidade de vivência plena e digna da sexualidade.

Afinal, que democracia é esta? Que mundo é este em que vivemos? Quando as vozes daqueles oprimidos pelo sistema, daqueles insatisfeitos com as desigualdades e com as opressões sociais poderão dar volume a suas vozes reivindicatórias?

Quando poderemos abertamente discutir o que é ser homossexual, e talvez nos questionar até onde é realmente necessário tal estereótipo para o ser humano? Quando nos perguntaremos se nosso vizinho está realmente feliz, e até onde podemos contribuir para a garantia da fraternidade, sem tropeçar em pré-requisitos e rótulos?

Certamente não conseguiremos isso recorrendo a analistas, ficando no armário, fechando-se em guetos ou indo brincar, uma vez por ano, na Parada Gay.

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